segunda-feira, 14 de julho de 2014

1- INTRODUÇÃO - Exposição de Efésios 6:10 a 13

Efésios 6:10-13 No demais, irmãos meus, fortalecei-vos no Senhor e na força do seu poder. Revesti-vos de toda a armadura de Deus, para que possais estar firmes contra as astutas ciladas do diabo. Porque não temos que lutar contra a carne e o sangue, mas sim contra os principados, contra as potestades, contra os príncipes das trevas deste século, contra as hostes espirituais da maldade, nos lugares celestiais. Portanto tomai toda a armadura de Deus, para que possais resistir no dia mau e, havendo feito tudo, ficar firmes.

1- INTRODUÇÃO

“No demais, irmãos meus, fortalecei-vos no Senhor e na força do seu poder.” Estas palavras introduzem uma exposição que, começando neste ponto, vai mais ou menos até o fim desta Epístola aos Efésios. É uma das mais ressonantes e eloqüentes declarações do apóstolo Paulo de como se deve viver a vida cristã. À palavra “Finalmente” * é que primeiramente devemos dar atenção, porque seu significado precisa estar claro para nós. “Finalmente, irmãos meus”, diz Paulo. Que quer ele dizer com “Finalmente”? Estará dizendo apenas, “De fato já disse tudo que queria dizer”? Será apenas uma indicação de que a carta está perto do fim? Naturalmente, num sentido é isso. Mas se o considerar mos meramente sob essa luz, perderemos o verdadeiro ponto daquilo que está sendo dito aqui. Não se trata apenas de uma espécie de pós- escrito; não se trata de um pensamento que ocorreu depois. Não é que o apóstolo, tendo dito tudo que tencionava dizer, concluiu sua carta e, então, lembrou que havia uma outra coisa que devia ser mencionada. Noutras palavras, há uma ligação muito direta entre o que Paulo começa a dizer aqui e o que tinha acabado de dizer. Na verdade vou além. Há uma direta e imediata relação entre isto e todo o conteúdo da epístola até este ponto. Ele leva a sua argumentação até o fim, e quando chega a esta exposição, ela vem a ser tão-somente um ulterior prolongamento do grandioso tema. É muito importante, pois, que coloquemos esta grandiosa exposição na seu legítimo cenário e na perspectiva certa. Em primeiro lugar, permitam-me lembrar-lhes os principais temas desta epístola. Falando em termos gerais, podemos dizer que nos três primeiros capítulos o apóstolo está lembrando a estes efésios e, por meio deles, está nos fazendo lembrar as grandes doutrinas, os postula dos fundamentais da fé cristã. Ele os faz saber quem são, o que são e como vieram a ser o que são. Esse é o seu tema. Todas as doutrinas importantes da fé cristã podem ver-se nestes três primeiros capítulos. Naturalmente Paulo tem sua própria maneira de colocá-las diante de nós. Sem dúvida, o seu principal objetivo é dar-nos um quadro descritivo da glória e do elevado caráter da vida cristã. Ele o põe às claras na segunda metade do capítulo três, onde diz algumas coisas quase incríveis. Diz ele que ora pelos crentes efésios para que sejam “cheios de toda a plenitude de Deus”, e lhes lembra que Deus “é poderoso para fazer tudo muito mais abundantemente além daquilo que pedimos ou pensamos, segundo o poder que em nós opera”. Temos aqui uma grandiosa descrição daquilo que o cristão dever ser. Paulo nos disse como nos tomamos cristãos — pelo sangue de Cristo (Efésios 1:7). Tudo isto faz parte do grande plano de Deus, elaborado na eternidade, como o apóstolo nos diz no capítulo primeiro. Cristo veio e a Sua obra de salvação está sendo realizada. Entraram os judeus, entraram os gentios, e estamos juntos neste corpo, neste novo homem, a Igreja (2:16). Entretanto, o apóstolo deseja que os efésios entendam, acima de tudo mais, os privilégios pertencentes a tal vida. Assim ele tinha orado, no capítulo primeiro: “Tendo iluminados os olhos do vosso entendi mento, para que saibais qual seja a esperança da sua vocação, e quais as riquezas da glória da sua herança nos santos; e qual a sobreexcelente grandeza do seu poder sobre nós, os que cremos.” Noutras palavras, se tão - somente nos déssemos conta do elevado caráter da nossa “sober ana vocação”, toda a situação se transformaria. Ele escreve três capítulos para colocar os seus leitores face a face com este ensino. Depois, tendo feito isso, o apóstolo começa a instar e pleitear com eles, a que vivam de maneira digna da sua vocação. Esse é o método apostólico. Paulo nunca inicia com a moralidade e com a conduta. Invariavelmente temos este grande contexto. Nenhuma pessoa poderá viver a vida cristão enquanto não for cristã, enquanto não souber o que é ser cristão, enquanto não tiver uma concepção da glória da posição cristã. Por isso o apóstolo começa o capítulo 4 dizendo: “Rogo-vos, pois, eu, o preso do Senhor, que andeis como é digno da vocação com que fostes chamados”, e desse ponto até o fim da epístola ele continua fazendo este grande e grandioso apelo. Mas observamos que, mesmo depois de haver começado com esse temas prático, Paulo ainda não consegue deixar de lado a doutrina, pois, nos primeiros 16 versículos do capítulo 4 temos uma das mais marav ilhosas exposições da natureza da Igreja cristã que se pode encontrar em toda e qualquer parte das Escrituras. Somente a partir do versículo 17 ele volta a esta questão da aplicação prática: “E digo isto, e testifico no Senhor, para que não andeis mais como andam também os outros gentios, na vaidade do seu sentido... (mas que) vos revistais do novo homem, que segundo Deus é criado em verdadeira justiça e santidade.” Noutras palavras ele lhes diz: “Agora que lhes recordei o que vocês são, e como vieram a ser o que são, quero que vejam que é essencialmente uma questão de lógica e de aplicação da verdade, que lhes compete viver a espécie de vida que agrada a Deus. Diz ele: vocês nasceram de novo, não são mais como aqueles outros gentios que continuam vivendo em pecado e em inimizade para com Deus. Bem, não contin uem vivendo como se essa ainda fosse a situação com vocês. Seria incoerente fazê-lo, seria irracional. Têm de dar evidência em suas vidas que nasceram de novo. Assim, ele os faz lembrar que o Espírito Santo habita neles; Ele não habita nos que não são cristãos, E os cristãos devem manifestar o Espírito que neles habita. Não devem entristecer o Espírito. Depois lhes recorda que eles são “filhos amados” de Deus. Os outros não são filhos de Deus. Só é possível alguém tornar-se “filho de Deus” em Cristo Jesus. Deus criou todos os homens, e às vezes o termo “filhos” ou “geração” é empregado nesse sentido (Atos 17:28). Todavia, no sentido neotestamentário comum, sermos “filhos de Deus” é estar numa relação que nos é dada; na expressão de João, aos que receberam a Cristo, Ele “deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Deus; aos que crêem no seu nome” (João 1:12). Portanto, Paulo argumenta: uma vez que vocês são filhos amados de Deus, não se portam como as demais pessoas, há algo especial quanto a vocês, e vocês demonstram isso constantemente em seu procedimento. E então, finalmente, ele os faz lembrar-se de que são filhos da luz. Diz ele: “Porque noutro tempo éreis trevas, mas agora sois luz no Senhor: andai como filhos da luz” (Efésios 5:8). Vocês vieram das cavernas subterrâneas em que os filhos da iniqüidade passam o seu tempo e mantêm as suas relações. Vocês vieram para a meridiana luz de Deus, para a ampla luz do sol e, portanto, não fiquem às apalpadelas na escuridão, mas vivam como filhos da luz, glorificando seu Pai. Depois vem outra seção, que começa na versículo 18 do capítulo 5, onde o apóstolo diz: “E não vos embriagueis com vinho, em que há contenda (ou “excesso”), mas enchei-vos do Espírito.” Esta nova seção estende-se até o versículo 9 do capítulo 6.0 argumento de Paulo é que, quando somos cheios do Espírito Santo, temos que viver de maneira única, coisa que nunca fazemos se não somos cheios do Espírito. Ele desenvolve o argumento seguindo várias linhas. Se vocês são cheios do Espírito, diz ele, quando se reunirem na comunhão da igreja, haverá grande louvor e ação de graças. “Falando entre vós em salmos, e hinos, e cânticos espirituais: cantando e salmodiando ao Senhor no vosso coração; dando sempre graças por tudo a nosso Deus e Pai, em nome de nosso Senhor Jesus Cristo.” Que descrição da Igreja cristã! E que contraste com o que se vê muitas vezes hoje! Depois o apóstolo põe-se a dizer que todos nós devemos sujeitar- nos uns aos outros, e desenvolve isso em três aspectos principais. As mulheres devem sujeitar-se aos seus maridos, os filhos aos seus pais e os servos aos seus senhores. Contudo, ele sempre o expressa de maneira doutrinária. O marido deve amar sua esposa “como também Cristo amou a igreja, e a si mesmo se entregou por ela.” Não se pode achar esse tipo de sujeição em ninguém, exceto nos cristãos. Mas todo marido cristão e toda esposa cristã devem estar manifestando o fato de que são “cheios do Espírito”; e devem constituir um espanto para o mundo. A mesma coisa vale para a relação de filhos e pais. Esta precisa ser o oposto exato daquilo que testemunhamos hoje — nada de rebelião, porém honrar pai e mãe. E o pai não deve provocar a ira a seus filhos. Antes, uma vez que ele é cheio do Espírito, há compreensão, tolerância, paciência e tudo quanto é necessário. E deve acontecer a mesma coisa quanto aos senhores e servos cristãos, e quanto aos servos e senhores cristãos. Paulo sempre trata dos dois lados. Fala aos servos, que naqueles dias eram escravos, sobre como devem portar-se; e fala aos senhores também, dizendo-lhes que se lembrem de que o Senhor dos servos e deles “está no céu, e que para com ele não há acepção de pessoas.” Dessa maneira Paulo mostra como, nas várias relações hu manas, esta “vida no Espírito” se manifesta. Tendo feito isso tudo, o apóstolo diz agora: “No demais (“Fi nalmente”), irmãos meus”, como se dissesse: agora, à luz de tudo que venho dizendo sobre vocês e sobre o tipo de vida que devem viver, isso é tudo? “Não”, diz ele, “ainda há outra questão.” E essa questão que ele nos apresenta agora, para nossa consideração. Ele não para no fim do versículo 9 do capítulo 6, e pela seguinte razão: não devemos viver esta vida cristã no vácuo. Não se trata apenas de uma questão de, “Bem, aí está isso tudo diante de vocês; agora vão e pratiquem isso.” Há outra matéria que precisa ser considerada, há outro fator que, num sentido, Paulo ainda não mencionou, a saber, a poderosa oposição ao viver cristão, oposição que inevitavelmente todos enfrentamos neste mundo passageiro. É esse o assunto que Paulo introduz aqui. Ele nos havia feito lembrar o que somos, nos havia mostrado as possibilidades próprias da nossa nova posição, e de que não há limite, não há fim para elas. “Que sejais cheios de toda a plenitude de Deus.” Para “poderdes perfeitamente compreender, com todos os santos, qual seja a largura, e o compri mento, e a altura, e a profundidade, e conhecer o amor de Cristo, que excede todo o entendimento”. Sem limite! Sem fim! “Que coisa maravilhosa!”, dirão vocês. Esperam um minuto, diz o apóstolo.
Permitam-me lembrá-los de que vocês terão que viver essa espécie de vida num mundo em que há um tremendo poder trabalhando contra vocês, de que estarão envolvidos num terrível conflito com o diabo e com todas as suas hostes. Se vocês não compreenderem isso, diz ele, e não se lançarem à ação adequada com respeito a isso, serão indu- bitável e inevitavelmente derrotados. Assim ele é impelido a introduzir este assunto. Daí, “Finalmente” não significa apenas, “Bem, agora, eu lhes disse isto, isso e aquilo. Espera! Há mais uma coisa!” Nada disso! O que temos aqui é uma parte vital do quadro todo. Poderíamos muito bem traduzir a palavra, que em nossa Versão Autorizada aparece como “Finalmente” por “Daqui por diante”, “Por conseguinte” ou “Quanto ao mais” (como na Versão de Almeida, Edição Revista e Corrigida, que diz, “No demais”). Não importa qual dessas expressões empreguemos. Aí temos, então, a cena em que se enquadra este vocábulo, “Fi nalmente”. Não basta saber tudo que o apóstolo já nos havia falado acerca da vida cristã; também precisamos compreender e aceitar o que ele está prestes a nos dizer. Ainda faz parte do quadro todo e do seu ensino essencial. Ao introduzirmos este grande assunto, compete-nos primeiro ofere cer uma ampla análise da seção, expor as divisões da matéria, para podermos ter o quadro bem claro em nossas mentes. Feito isso, farei alguns comentários gerais da matéria, antes de proceder à análise minuciosa. Mas, ao dividir esta seção a partir do versículo 10 e indo até o versículo 19 ou 20, vejo-me ante uma dificuldade, embora esta não seja de vital importância para a verdade. Existe uma obra muito famosa sobre este assunto, de William Gumall, um grande puritano que viveu há 300 anos, obra intitulada “O Cristão com Armadura Completa” (The Christian in Complete Armour), um livro volumoso que felizmente está de novo em disponibilidade em nosso país (Grã-Bretanha). É um grande clássico que tem alimentado a alma a incontáveis peregrinos cristãos durante os últimos 300 anos. Agora, para minha decepção e consternação, não posso aceitar a divisão que William Gumall faz do assunto. Num sentido esta é uma questão mecânica, porém apesar disso, me parece importante. Eis como o divide Gumall: diz ele que aqui há duas partes principais, a primeira sendo o versículo 10, somente este versículo. A segunda parte, diz ele, inclui os versículos 11 a 20. Ele expõe a matéria da seguinte maneira: primeira parte, versículo 10 — “Breve, mas suave e poderoso encorajamento” para este combate cristão. Segunda parte, versículos 11 a 20 — temos aqui “diversas orientações para que os cristãos conduzam este combate de maneira a mais vitoriosa, com alguns motivos esparsos aqui e ali entre elas.” Realmente não posso aceitar essa divisão, e me atrevo a sugerir uma melhor. Concordo que há duas partes principais, no entanto, na minha opinião, a primeira vai do versículo 10 ao 13, onde temos uma exortação geral. A segunda parte, nos versículos 14 a 20, dá instruções detalhadas com relação à exortação geral. Parece-me que é esta a divisão natural. Primeiro, o geral; depois, o particular. É evidente que no versículo 14 o apóstolo está partindo daquilo que tinha acabado de dizer em termos gerais; agora ele o vai desenvolver em particular. “Estai pois firmes, tendo cingidos os vossos lombos com a verdade, e vestida a couraça da justiça”, etc. O trecho que vai do versículo 14 em diante é, evidentemente, a aplicação pormenorizada do que ele dissera em geral na primeira parte, versículos 10 a 13. Todavia, devemos subdividir a primeira parte. Nos versículos 10 a 13 temos o que denomino “uma exortação geral”, ou que poderia ser mais bem descrito como “uma convocação para a batalha”. Não consigo entender como Gumall pôde introduzir aqui a palavra “suave” (“sweet”). Ele acrescenta a palavra “poderoso”, admito — “Breve, mas suave e poderoso encorajamento”. E o que me chama a atenção é o poder; é uma emocionante convocação para a guerra, uma ressonante exortação. Mas o apóstolo faz uma divisão disso. Primeiro, ele nos diz como preparar-nos para esse combate, e há duas subdivisões: (1) Versículo 10: “Fortalecei-vos no Senhor e na força do seu poder”. (2) Versículo 11, com repetição no versículo 13, para ênfase: “Revesti-vos de (tomai) toda a armadura de Deus.” Depois, no final do versículo 11 e no versículo 12 ele dá a razão pela qual faz esta convocação para o combate. A primeira pergunta é: como devo preparar-me para o combate? E a resposta é dupla: “Fortalecei-vos no Senhor e na força do seu poder”; e: “Revesti-vos de toda a armadura de Deus.” Em seguida, porém, ele faz uma coisa que invariavelmente se vê em todas as suas cartas. Ele nos diz por que precisamos dessa preparação. Pois bem, isso é típico das Escrituras, que nunca nos mandam fazer uma coisa sem explicar por que devemos fazê-la. Por que deverei ser forte “no Senhor e na força do seu poder”? Por que será absolutamente indispensável que eu me revista, não apenas de uma ou duas peças da armadura, e sim “de toda a armadura de Deus”? Eis a resposta, de novo subdividida: no versículo 11 ele diz: será melhor que vos revistais de toda a armadura de Deus “para que possais estar firmes contra as astutas ciladas do diabo.” Depois ele se põe a desenvolver o ponto no versículo 12, que é apenas uma análise das “ciladas do diabo”. “Por que deverei revestir-me da armadura toda?”, perguntará alguém. “Por que deverei cuidar para ser forte no Senhor e na força do seu poder?” Aqui está a resposta: “Porque não temos que lutar contra a carne e o sangue, mas sim contra os principados, contra as potestades, contra os príncipes das trevas deste século, contra as hostes espirituais da maldade, nos lugares celestiais”. Aí está a razão pela qual você precisa disso tudo, e será um tolo se não compreender isto e se deixar de agir de acordo. Você se defronta com esse tipo de inimigo e de oposição, diz o apóstolo. Entretanto Paulo acrescenta também: “para que possais resistir no dia mau”. A vida é sempre uma batalha, mas há ocasiões piores que outras. Há “dias maus”. Às vezes, quando acorda de manhã, você se sente (não se sente?) como se tudo irá correr mal. É um dia mau, e o diabo parece ocupar-se em seguí-lo por toda parte, em ameaçá-lo, insultá-lo, em zombar de você, ridicularizá-lo, em lançar-lhe dardos inflamados! Bem, há dias maus, e o homem que não se der conta da sua ocorrência, certamente será derrotado. Se você quiser ser capaz de “resistir no dia mau”, ser forte “no Senhor e na força do seu poder”, revista-se “de toda a armadura de Deus”. Você precisará dela toda. E depois, como se quisesse aplicar 9 ponto diretamente a nós, ele diz: “e, havendo feito tudo, ficar firmes.” É uma coisa e tanto ser capaz de “ficar firme” num mundo como este. Há gente caindo a torto e a direito, por toda parte. Vê-se isto no mundo e, infelizmente, vê-se isto na Igreja. É grande coisa ser capaz de “ficar firme”. Esse é o por quê da exortação e da explicação que o apóstolo dá do único modo pelo qual a pessoa pode ficar firme. Essa é, pois, a nossa análise da primeira das duas partes principais à qual chamo “Uma exortação geral”, ou “Uma convocação para o combate”. E então, na segunda parte Paulo se põe a dar-nos as instruções detalhadas. Ele não se arrisca. Como um bom professor, ele nunca toma coisa alguma como líquida e certa. Ele pergunta: você se revestiu de toda a armadura? Você está partindo com os seus lombos cingidos? A couraça está bem colocada? Seus pés estão calçados? Sua cabeça e todas as partes estão cobertas? Toda as partes devem estar bem guarnecidas; assim, ele as examina minuciosamente. Não se detém após uma instrução geral, mas prossegue e dá instruções detalhadas sobre como cada parte deve ser vigiada e protegida. O quadro está claro em nossas mentes? Tenho que compreender quem sou e o que sou, e é inevitável que eu deseje viver de maneira digna da minha vocação. Quando você visita um país estrangeiro, deve lembrar-se da sua nacionalidade, e não deve deixar que o seu país sofra rebaixamento. Por isso mesmo deve cuidar muito do seu compor tamento. Este é um princípio que aplicamos em toda parte na vida. Aos filhos se diz que se portem bem nas festas. Por quê? Porque são representantes da família. E é a mesma coisa conosco, não importa que idade tenhamos. Contudo isso não basta; temos que compreender mais uma coisa, e temos que estar preparados para enfrentá-la, a saber, esta oposição movida pelo diabo. Desejo fazèr alguns comentários gerais do ensino do apóstolo nesta altura, antes de chegarmos ao tratamento detalhado. Tomemos, por exemplo, esta questão da relação desta seção com tudo que a precede. Alguém poderá dizer: “Pois bem, em que medida isto difere do que Paulo já nos havia dito?” A diferença é que, até aqui, Paulo tem falado da vida cristã mormente em termos do conflito que temos com o mundo que nos cerca, e da “carne”. Ele sabe que os crentes efésios, embora cristãos verdadeiros, ainda têm em si algo da velha natureza. Ainda há pecado no corpo, na carne, e até aqui ele estivera realmente tratando desse mal. Há um inimigo por dentro, há um poder oculto que está sempre pronto a assumir o controle da nossa carne e, como diz o apóstolo, escrevendo aos romanos, está sempre pronto a reinar em nosso “corpo mortal” (6:12). Ora, em certo sentido é disso que ele estivera tratando até aqui. Mas agora ele fala do inimigo que está fora de nós — o diabo e suas hostes. Até aqui ele não tinha tocado nisso. O versículo 12 acentua imediatamente a diferença. “Porque não temos que lutar (somente) contra a carne e o sangue.” Não é só contra a carne e o sangue que temos que lutar, e sim também “contra os principados, contra as potestades, contra os príncipes das trevas deste século, contra as hostes espirituais da maldade, nos lugares celestiais.” Portanto, não há diferença essencial entre aquilo de que Paulo vai tratar agora e aquilo de que vinha tratando até aqui. Não devemos exagerar, estabelecendo aqui uma distinção absoluta. É uma distinção no pensamento, é claro, porém não é uma distinção na prática. O que quero dizer é que o diabo pode agir em nós, e pode fazê- lo por meio dos nosso corpos, por meio dos nosso instintos. O diabo pode utilizar-se de qualquer coisa. Indicarei mais adiante como ele pode até causar doenças, indisposição, depressão e infortúnio. O diabo pode fazer tudo isso dentro de nós, de modo que não devemos fazer uma divisão absoluta aí. E, contudo, é uma divisão deveras real. Noutras palavras, nunca devemos esquecer-nos do diabo, nunca devemos esquecer-nos dos “principados” e “potestados”. Jamais devo pensar que todo o meu problema se limita àquilo que há dentro de mim e das outras pessoas. Acima e além disso está este outro fortíssimo poder em formação de combate contra mim, o mais forte de todos os poderes fora o poder do próprio Deus. Não lembrar este fato básico é expor-se ao fracasso e à ruína. O grande problema do mundo atual, e infelizmente da Igreja, é que tão pouco sabem do diabo e dos “principados" e  “potestades”. Muitos ensinamentos a respeito da santidade e da santificação nunca sequer mencionam o diabo e esses poderes. Considera- se o problema como uma coisa limitada a nós mesmos. Daí a total falta de adequação de muitas soluções propostas. Mas, além disso, como já procurei dar a entender, esta seção da epístola é de vital importância quanto a todo o problema da doutrina bíblica sobre a santificação e a santidade. É uma das passagens cruciais, no que se refere a essa doutrina, porém, como já disse, é uma passagem curiosa e estranhamente esquecida e negligenciada. Que é que ela nos diz? A vida cristã, em primeiro lugar, é um combate, é uma luta. “Temos que lutar.” A seção toda é destinada a imprimir em nós este fato. Não há maior e mais grosseira falsificação da mensagem cristã do que aquela que a retrata como nos oferecendo vida fácil, sem combate nem conflito. Há tipos de doutrina da santidade que ensinam justamente isso. Seu lema é: “É muito fácil”. Dizem eles que o problema está em que muitos cristãos ignoram esta fato e, por isso, continuam lutando e pelejando. Essa é a característica essencial do ensino das seitas. É por isso que elas sempre são muito populares. “Muito fácil! Uma vida tranqüila!” Não se pode encaixar isso nesta epístola, com o seu “Temos que lutar! ” “Fortalecei-vos no Senhor e na força do seu poder. Revesti- vos de toda a armadura de Deus, para que possais estar firmes.” A primeira coisa que temos que perceber é que a vida cristã é uma guerra, que somos estrangeiros em terra alheia, que estamos no território do inimigo. Não vivemos no vácuo, numa estufa de floricultura. O ensino que dá a impressão de que a vereda para a glória é inteiramente fácil, simples e plana não é cristianismo, não é o cristianismo de Paulo, não é o cristianismo do Novo Testamento. Este é sempre o rótulo do remédio do curandeiro, que cura tudo com a maior facilidade. Basta uma dose, e o mal se vai! Em segundo lugar, este é um combate que eu e vocês temos que travar. “Fortalecei-vos no Senhor e na força do seu poder.” Vocês têm que ser fortes. “Revesti-vos de toda a armadura de Deus, para que possais estar firmes”, “e, havendo feito tudo, ficar firmes” — “Ficai firmes, pois” — VÓS! Não é somente uma guerra; é uma guerra na qual eu e vocês temos que pelejar. Que isto fique claro para nós. Há um ensino que diz: “Amados irmãos, vocês vêm cometendo um grande erro; vocês vêm procurando lutar nesta batalha; precisam parar com isso.” Diz essa doutrina que só nos cabe fazer uma coisa: “Entreguem tudo ao Senhor”, e tudo correrá bem. “Entreguem tudo ao Senhor; Ele lutará por vocês.” Mas não há como enquadrar isso nos ensino que temos nesta passagem. Não vejo o apóstolo dizendo-me que entregue tudo ao Senhor, que Ele travará as minhas batalhas por mim, enquanto que eu simplesmente me sento e gozo o fruto da Sua vitória. Isso não está no texto! Eu tenho que lutar! Outro modo como esse ensino é expresso às vezes é o seguinte: “Soltem-se e deixem tudo com Deus”. “Soltem-se”, dizem os mestres desse ensino; “Vocês já se empe nharam, já tentaram... soltem-se, deixem tudo com Deus. Tudo está bem, vocês já têm a vitória. É muito simples; não se requer nenhum esforço.” Mas certamente o que lemos em Efésios é exatamente o oposto desse ensino. Eu e vocês é que temos que estar na luta. Graças a Deus, recebemos força, poder e armas, porém nós é que temos que pelejar. Recebo tudo de que necessito, e recebo o poder para utilizá-lo. Não relaxo pura e simplesmente, ficando meramente a olhar e a colher os frutos da vitória do Outro. Não, Ele me faz mais que vencedor; contudo a batalha é minha, e eu é que tenho que lutar nela. Estes princípios são fundamentais com relação à doutrina da santificação. E creio que grande parte do declínio da Igreja cristã atual se deve ao fato de que está na moda esse outro ensino. Pois bem, em terceiro lugar, observem a maneira pela qual somos chamados para este combate. Notem como Paulo expressa a convo cação, ou seja, esta instrução geral, esta exortação geral. Tenho-me referido a ela como “uma convocação para o combate”. O outro ensino a que me referi, às vezes se apresenta como oferecendo uma espécie de clínica para almas doentes. Dizem os seus promotores: “Você está espiritualmente enfermo, espiritualmente ferido e espiritualmente derrotado. Há uma clínica para você e há uma mensagem que lhe dará alívio e que ajudará a curar as suas feridas, e o levará a um caminho de vitória sem luta.” Uma clínica! Todavia não há clínica aqui; o que há é um quartel! Ou deixem-me expressá-lo doutro modo. Não há nada de sentimen tal aqui. Estabeleço como uma proposição fundamental que, se algum ensinamento concernente à santidade e à santificação é sentimental, não é bíblico! Há uma série de livros que se traem, ao que me parece, por seus próprios títulos. Um exemplo é a obra intitulada, “Conversas Tranqüilas sobre Poder” (Quiet Talks on Power). Poderá alguém encaixar essa idéia nas palavras que o apóstolo emprega aqui? Há uma contradição nos termos empregados. Não se pode ter uma conversa tranqüila sobre poder; não se pode ter uma conversa tranqüila sobre as Cataratas do Niágara; não se pode ter uma conversa tranqüila sobre a explosão de uma bomba atômica. Uma conversa tranqüila sobre poder! É uma coisa sentimental, molenga, fraca. Não é isso que temos aqui! Ouso ir mais adiante e dizer que, certamente, nada tem feito tanto dano à verdadeira doutrina da santificação como aquilo que geralmente se descreve como “conversas devocionais”. Isso faz parte deste mesmo “belo ensino” — conversas ou palestras devocionais tranqüilas, com ilustrações ingênuas e melosas! Mas não é disso que o apóstolo está falando. O que temos aqui é o oposto exato. Temos uma atmosfera marcial, um chamamento vibrante, estimulante. Éum toque de clarim — “FORTALECEI-VOS NO SENHOR E NA FORÇA DO SEU PODER. REVESTI-VOS DE TODA A ARMADURA DE DEUS.” Vocês não ouvem o clarim e a trombeta? É uma convocação para a batalha; estamos sendo despertados, estamos sendo estimulados, esta mos sendo postos de pé; é-nos ordenado que sejamos homens. Toda a tonalidade é marcial, é varonil, é vigorosa. Depois vamos tratar de aperceber-nos de que não há nada rápido e fácil nisso tudo. Temos que continuar pelejando. “Vista a armadura do evangelho. Vista cada peça com oração.” Não fazemos simplesmente uma coisa e depois tudo fica bem, tudo fica certo. Não. Paulo nos dá todos estes pormenores, e requer tempo para levá-los a bom termo. Não há nada rápido e pré-fabricado nisso; temos que desenvolvê-lo e levá- lo a efeito ponto por ponto. Finalmente, temos que continuar a fazê-lo. “Não há dispensa nessa guerra.” Enquanto eu e você vivermos neste mundo, o diabo estará presente com toda a sua malignidade e perversidade; e ele nos com baterá até o fim, ele nos combaterá até ao nosso leito de morte. Isso é falta de esperança? É o contrário! É glorioso. É-nos dado o privilégio de seguir as pegadas de nosso Mestre e Senhor. “Qual ele é, somos nós também neste mundo” (1 João 4:17). É um conflito tremendo; mas eu posso fortalecer-me “no Senhor e na força do seu poder”; posso revestir-me de “toda a armadura de Deus”. Você está pronto para a batalha? Está alerta? Está de pé? Estará você cedendo às suas fraquezas, aos seus caprichos e às suas fantasias, e estará tendo pena de si mesmo, queixando-se e gemendo por este e aquele problema ou situação? Levante-se, sacuda tudo isso, ponha-se de pé, seja homem! Trate de dar-se conta de que você é um membro deste poderoso regimento de Deus, travando a batalha do Senhor e destinado a usufruir os gloriosos frutos da vitória durante as incontáveis eras da eternidade. Você ouviu o toque de reunir do clarim? “Fortalecei-vos no Senhor e na força do seu poder. Revesti-vos de toda a armadura de Deus.”

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